quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Movimento Estagnado


Mais um ano passou!!
Brilham os fogos de artifício.
Tá, ta-ra-ra-ta, poww!!!
Só isso...


O mundo circulou o sol,
Espermatoziodes se tornaram filhos,
Fez mais buracos o Aerozol,
É... o metrô não corre nos trilhos...


Mas muitas coisas transformei,
Cá, com meu jornal. Sentado.
Alimentos defequei,
Meu movimento estagnado...

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Não sonha?!



Seu humano! Racional!
Não tem Esperança?
Não Sonha?

Persegue a coerência!
Faz repulsa a demência!
Não sonha!

Ilusão é doença!
O comestível é bonança!
Não sonha!

Será ele apenas carne?
Além dos ossos que a sustenta?
Não sonha?

Eu, observo risonho.
Em meu gesto idiossincrático.
Apenas sonho...

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Serra da Caraconha | Cap_7



O trecho mais difícil foi vencido. A ferida da corajosa senhora secara. Não mais manchava as rochas com seu sangue. A impressão de velha frágil que a acompanhara durante quase todo o trajeto ficou para a trás. Os passos inseguros e a expressão de dor se perderam na toca da onça.

Agora falava alto e desatadamente, como uma pessoa bastante comunicativa que bebeu demais. “Manda essas fotos para o meu e-mail que quero botar no Orkut”, ordenava a um dos aventureiros provocando graça. Seu tom de voz fazendo-me lembrar Dercy Gonçalves.

O meu suor fazia as duas garrafas escorregarem bermuda a dentro o tempo todo. Tinha que ficar puxando-as para a cintura e inflar o estômago para apertá-las. Esse gesto me dava a impressão de ter emagrecido uns dois quilos naquela escalada. O sol ficava cada vez mais quente. Minha vontade de descansar aumentava.

A senhora eufórica estava poucos metros atrás de mim. Cantarolando, reclamando com um e outro e até proferindo palavras ofensivas ao “capelão”. Usava apenas uma das mãos para apoiar-se. Na outra, carregava dois pequenos cactos. A ausência de medo chegava a ser preocupante. Certamente o comportamento inconseqüente era resultado da produção desordenada (desregulada) de adrenalina em seu corpo...

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Lembranças desatadas


Desvaneceram com tua presença,


Mágoas pensadas eternas,


Feridas mal curadas,


Agora desintegradas,


Não passam de leves lembranças,


Na mente que tu governas...

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Serra da Caraconha | Cap_6



O medo havia invadido os sentidos de Mara a ponto de deixá-la convencida de que não daria mais um passo. Precisava de proteção, segurança, ausência de riscos. A situação lhe proporcionava o inverso de tudo isso. Gritava. As lagrimas descendo, molhando-lhe as têmporas ainda rosadas. Sua expressão mudando a cada instante. Insegurança, tristeza, medo, desespero...


A forma como seus olhos transpareciam seus sentimentos era quase sobrenatural. Como se um auxílio sobre-humano de repente nos dotasse de poderes telepáticos. Palavras de incentivo iam atingindo-a em cheio, fazendo-a, aos poucos, desvencilhar-se dos laços do medo.


Apoiada por braços amigos, ela decidiu empregar as forças que lhe restavam para combater a rocha. Em sua mente, via esta gritando para ela:
- Daqui você não passa! - determinou a barreira de pedra.
- Ah! Vamos ver!! - desafiou Mara.


Ainda com medo, levantou as mãos e tateou a grande pedra, tentando encontrar alguma saliência. Encontrou apenas sutis irregularidades. Seus braços e pernas se movem. Os olhos se fecham. O movimento se repete. Seus olhos se abrem. Viu-se na toca da onça, de cara para um tijolo preso com cimento na rocha. Agarrou-o e o sangue voltou a circular com mais naturalidade, amenizando sua palidez.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Raiva


A raiva motiva,
Dilata as retinas,
Reconstrói as ruínas,
Decisão instintiva.

Vontade de matar primeiro,
Morrer depois,
E no fim nada sobra,
Nenhum dos dois...

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Leve Torpor

Vou fazer um poema pequenininho
Pro meu amigo Sobrinho
Colocar na Fábula Quadrada
Um pouco do meu carinho.

De mansinho com leve torpor
Atingindo sem dor
O coração daquele
Pra quem dou valor

Triunfante, retumbante
Como uma canção pra lembrar
Que amigo é coisa pra se guardar
E, ainda que por um instante,
emocionar....

(Laís Trindade)

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O Maluco do Punhal | Cap. 4


(Leia o primeiro capítulo da série: Maluco do Punhal Cap. 1)

Era o homem estranho, recém chegado na vila, que adentrara no bar e cerrara a porta. Os irmãos de apelidos estranhos sentiram algo diferente naquele momento. Era o coração impulsionando-se para cima. Como se tentando fugir pela boca. Um frio na espinha. Um nó na garganta...

Era medo. O metal reluzente se aproximava. Dançante e veloz. Loreta sacou seu revólver e atirou na direção do punhal. A explosão da pólvora provocou um curto instante de luz. Viram o facínora abaixado. Mais uma vez a escuridão. O punhal parecia voar como uma pomba. Passando entre eles. Por cima deles. Eram saltos? O movimento do objeto que refletia a luz parecia sobrenatural.

Outro clarão repentino acompanhado de um estouro ensurdecedor. Foi outro tiro. Este vez, Loreta viu-o nitidamente. Um monstro. Rangendo os dentes como um lobo prestes a atacar a presa. O garoto ensangüentado ouviu um grito longo. Era um grito de dor...
(Continua no quinto post da série: Maluco do Punhal Cap. 5)

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

O Maluco do Punhal | Cap. 3


(Leia o primeiro capítulo da série: Maluco do Punhal Cap. 1)

Os moradores da humilde Vila da Pedra Branca temiam os dois irmãos. Até mesmo a polícia. Loreta e Buzina são filhos do coronel Abigail, um velho rico que comanda a cidade desde que se mudara para lá há cinco décadas. Abigail era impiedoso. Odiava mendigos. Dono de cachorros ferozes, soltava-os para que atacassem os pedintes que apareciam em sua porta. Divertia-se com os desesperados clamores por ajuda.

Caso o mendigo conseguisse desvencilhar-se das presas caninas e imobilizasse o animal, o velho soltava um segundo cão. O ritual continuava até não se ouvir mais gritos. Então chamava o mordomo para remover o corpo da fachada da casa...
(Continua no quarto post da série: Maluco do Punhal Cap. 4)

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O Maluco do Punhal | Cap. 2


(Leia o primeiro capítulo da série: Maluco do Punhal Cap. 1)

Dois bêbados invadiram um bar na esquina e faziam arruaça. Arivelton, um garoto tímido de cabelos loiros e apenas oito anos de idade, ficou incumbido de cuidar da loja enquanto seu pai, Zé de Piló, tinha ido entregar uma encomenda. A criança olhava impotente e assustada os dois ébrios destruindo a mercadoria do humilde estabelecimento.

Os irmãos Buzina e Lorota eram conhecidos pelo vandalismo que praticavam quando bebiam. Ficavam incontroláveis, como se possuídos por demônios. Balbuciavam palavras indecifráveis e reviravam os olhos como zumbis, deixando um rastro de violência e destruição por onde passavam.

Arivelton se abaixara num canto da loja. Garrafas de vidro espatifando-se próximo aos seus pés. Estilhaços furavam-lhe os braços. Chorava com medo e com dor. De repente, a única porta do pequeno recinto se fecha e a luz se apaga. Tudo ficou escuro como se fosse noite. A pouca luz que penetrava pela fresta da porta não era suficiente a ponto de permitir que o quarto indivíduo no aposento fosse identificado. Apenas via-se cintilar o espectro de um punhal...
(Continua no terceiro post da série: Maluco do Punhal Cap. 3)

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Serra da Caraconha | Cap_5


Sujo e exausto, as garrafas machucando meu corpo, consegui alcançar o primeiro tijolo. A cena de uma queda seguida de um escorregão desajeitado martelava minha mente com uma persistência dolorosa. Meus dedos doíam do tanto que eu os pressionava contra o tijolo. Pouco a pouco, um a um, fomos se aglomerando próximo daquele local. É que demorávamos muito para vencer aquela etapa e as pessoas que vinham atrás iam nos alcançando.

Uma demonstração de coragem, determinação e força de vontade inegáveis foi constatada por todos durante o percurso, mas principalmente naquele trecho mais difícil. Weslei (homônimo meu), um adolescente portador de necessidades especiais, mirou o topo da montanha, mesmo antes de começar a escalada, e definiu-o como sua meta. Suas limitações motoras não o impediram de agarrar-se aos tijolos e vencer a batalha contra as rochas. Pareciam nem existir diante da sua intrepidez.

Um dos pés devia estar apoiado no tijolo enquanto o outro tentava alcançar o seguinte. O processo devia ser feito com calma. O corpo sempre teimando em querer inclinasse para traz. Não houve tanto silêncio desde o início da investida. Até os MP3 foram interrompidos. A presença obscura de um abutre deu um tom mórbido ao ambiente. Ele estava bem acima do último tijolo. Lançando-nos um olhar furtivo. Faminto. Medonho. Olhava com uma expectativa apavorante. Como se sua próxima refeição fosse apresentar-se instantaneamente a sua frente.

Um grito. Outro grito. As tentativas de espantar o bicho eram totalmente ignoradas por ele. Fitava-nos como se caçoasse de nós. Zombeteiro e superior. Uma pedra foi lançada e a ave negra finalmente alçou vôo. Porém, não se afastou. Rodeava nossas cabeças, vigiando-nos sempre. Seu instinto parecendo muito mais consistente que nossa racionalidade. De repente, uma voz feminina quebrou o silêncio. Alguém começou a chorar desesperadamente...

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Salve-me das Chamas


ManuScrito esPorádico enviado aos Céus acinzentados pelo foGo resoluto Bruto ininterrupto incanDescente que fumega imPonente nas matas do pArque nAcional da chApada diAmantina menina inDefesa gritando enQuanto a dor atina e ningUém faz nada nega Água só Deus para impedir o oCorrido chão de vErde inExistente salve-O tv mal sintonizada não há vIda não há cor não há nada tudo Inferno de foGo injusto que queiMa inOcentes enquanto criminOsos dançam em grandes saLões repletos de eXtintores de Incêndio...

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

O Maluco do Punhal | Cap. 1


Uma figura medonha. Uma esfera envolta em cabelos como o sol cercado de chamas. Era sua cabeça pendendo sobre o corpo magro e comprido. Vestia farrapos. Estava imóvel fazia uma hora. Apareceu cambaleando no final da rua, fazendo com que toda a praça se calasse com sua presença. Um clima de obscuridade baixou no local com sua aparição como por mágica. Arrastou-se, sem dizer nada. Fitava o chão como se por obrigação. Sequer piscava.

O clima de rígida apreensão permaneceu no clímax durante 10 minutos. Foi o tempo que o forasteiro levou para se deslocar da esquina onde surgiu até a sarjeta da praça principal. O homem magro sentou-se, bruscamente, fazendo com que os presentes tomassem um susto. Um espasmo uníssono. Aos poucos, os burburinhos surgiram e aumentaram gradativamente. Até que o barulho comum da feira voltou a reinar. As pessoas que pararam, retornaram aos seus passos, acelerando-os de forma progressiva.

A figura não parecia mais tão estranha. Pelo contrário, encaixou-se perfeitamente no ambiente onde optou por acomodar-se. Sentou-se numa sarjeta suja. Seus pés estavam cercados pelas laranjas podres que foram descartadas pelos comerciantes locais. Ratos aproximaram-se, tranqüilos, do homem estranho, como se o conhecessem. Rodeavam seus pés fétidos como os gatos domésticos fazem com seus donos.

O forasteiro levou a mão a um dos bolsos da calça rasgada. Antes de fazê-lo, olhou, pela primeira vez desde que chegara, ao seu redor, exibindo um rosto medonho. Olhos profundos, cansados, famintos por algo. Algo mais do que somente alimentos. Mexeu com os pés. Os ratos fugiram como flechas disparadas simultaneamente para diversas direções. Seu rosto parecia ter sido apedrejado. Um monstro. Estava tão sujo que era impossível dizer a cor real da sua pele. Suspendeu o braço vagarosamente, trazendo em sua mão o objeto que agarrara dentro do bolso. Finalmente, o objeto cintilante mostrou-se...
(Continua no segundo post da série: Maluco do Punhal Cap. 2)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Para você Obama, um bom Governo!!



Barack Obama ainda nem colocou os pés na Casa Branca e uma áurea mitológica já o envolve. O favoritismo escancarado por parte população norte-americana (e mundial), através de demonstrações públicas que o superestimavam e outras que ridicularizavam o candidato republicano John McCain, seria, por si só, elemento necessário para definir sua vitória antecipadamente.

A complexidade das leis eleitorais dos Estados Unidos foi responsável pela apreensão e dúvida quanto ao resultado final. Não seria necessário roer unhas ou acabar com o estoque de batatas fritas do meu armário, como se estivesse assistindo um clássico BA x VI, se o pleito acontecesse no Brasil, por exemplo. Mas não fui o único. Em vários bairros de Salvador, a população se reuniu – com direito a tira-gosto e cervejinha – para acompanhar a contagem dos votos nos telões dos bares. Um típico clima de final de Copa do Mundo.

Mas por que o interesse? Interessa ao mundo por que envolve a todos diretamente. Os motivos que definiram a decisão de apoio ou repúdio a Obama não foram apenas políticos e econômicos. Foram sexuais, espirituais e até proféticos. Cogita-se, entre os adventistas, que o presidente eleito será o responsável pelo decreto dominical que antecederá a segunda vinda de Cristo. Países pobres da África acreditam que seus pedidos de socorro se tornarão mais audíveis. Grupos anti-racistas acreditam que este é o marco da imposição da Igualitariedade. Hollywood bateu na tecla até que seu desejo se tornou real (o ator Morgan Freeman que o diga). Será assim com os demais sonhos e expectativas?

Em meio a tantas indagações, pré-julgamentos, esperança e insegurança, uma certeza brilha: é a certeza de que as coisas vão mudar. Não sei que coisas. Também não sei se para pior ou melhor. Isto nós veremos. Como sempre, alguns verão que houve piora. Outros, que houve melhora. Mas veremos. Caso queiram me encontrar em meio a esta disputa ideológica, estarei entre os mais eufóricos da torcida dos otimistas.

domingo, 2 de novembro de 2008

A flecha errada


Subverter o ocasional,
Subjugar o praticante,
Submetê-lo a tortura cabal,
Subscrevendo seu passo vacilante.

Mudo, cego, distante,
Vou arrancar-lhe o coração,
Até admitir sinceramente,
Que não era amor e sim paixão.

Fala cupido imponente,
Por que você me enganou?
Comprei gato por lebre,
Agora o amor acabou.

Maldita flecha certeira,
Arrancou de mim a razão,
Veio tão leve e sorrateira,
Me fez objeto de compaixão.

Choro à noite, mas sem histeria,
Só balbuciando a prece que me resta:
"Um dia deixo de ser tão pateta,
Irei dormir e acordar poeta".

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Serra da Caraconha | Cap_4




Eram aproximadamente 15 metros do ponto onde estávamos até o centro da toca da onça – uma fenda escura formada por uma enorme rocha que ficava sob nossos pés e uma outra, ainda maior, que se debruçava sobre nossas cabeças. Foi o trecho mais demorado e perigoso de todo o percurso. A fenda parecia querer engolir-nos.

Não haviam pedras soltas (nem firmes) no percurso para nos servir de apoio. Apenas a pedra gelada, lisa, íngreme, indiferente... "Se pelo menos tivessemos uma escada", pensei. Vi hesitação nos olhos de alguns. Não vi nos meus porque não tinha um espelho. Começamos a escalada dolorosa, desta vez utilizando membros inferiores e superiores. Nada de cordas, nada de guinchos, nada de capacetes ou luvas. Só orações...

Encontramos alguns objetos que contrastaram bastante com a paisagem rústica e primária ao redor. Utensílios colocados pelo homem naquele trecho com o objetivo de possibilitar a escalada. Eram uns poucos tijolos presos com cimento na parede da rocha e uma torre de metal estirada na lateral do ponto mais aladeirado.

Haviam marcas de cimento sem tijolos, um sinal gritante de que a possibilidade dos tijolos se partirem era real. Já havia acontecido com outros aventureiros. Tentávamos não olhar para baixo. Não imaginar a queda fatal. Arrastamos-nos como cobras, lentamente, sujando nossas roupas com uma substância que pigmentava o chão, provavelmente era a defecação seca e esmiuçada dos insetos. Sujo e exausto, as garrafas machucando meu corpo, consegui alcançar o primeiro tijolo...

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Cafeína é vitamina?


O celular desperta,
A correria recomeça.
Um passo atrás do outro.
Olhos sempre alerta.

O atraso ao meu encalço.
Acelerado, contínuo, crescente.
“Oh! Motorista incompetente”.
Melhor seria correr descalço.

Invejo o vira-lata na esquina,
Tranqüilo, rende-se a sonolência.
Já eu, a beira da demência,
Total dependente da cafeína.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Fuga para a Bahia




Migração reversa no século XXII,

Todos sairão das metrópoles com destino à Bahia,

Onde não há correria, o cancão ainda assovia,

E o trabalho, só depois...



"O baiano sempre abre a porta,

leva a gente pra um passeio,

são 24 horas de recreio,

na terra onde o verde não desbota".

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Retrato

Pinte um quadro. Não será necessário sujar as mãos de tinta, basta compor com a mente.Quando a obra prima estiver concluída estaremos diante de uma figura singular, imaginada por todos, buscada por alguns.

Na tela virgem, comece a fazer um esboço da cena que mais provoca expectativa no ser humano: o advento, a segunda vinda de Cristo, o fim da dor. Fique atento aos mínimos detalhes na hora de colorir, não esqueça da penumbra em degradê, efeito causado pela luz crescente que parte do trono de Cristo. Se for bastante criativo e dedicado talvez (e esse ‘talvez’ apresenta relevância altamente significativa nesse contexto) consiga se aproximar do que pode ser considerado parecido com o evento mais esperado dos últimos 2008 anos. Não há nada mais satisfatório do que a sensação de ter realizado um belo trabalho. Certamente valerá o esforço. Pelo menos até aqui.

Sua ação a seguir será delicada. Espero não pôr a perder todo seu esforço de aproximar-se da beleza real que aguardamos com o próximo passo que concluirá sua obra de arte, pois, o acabamento da pintura exigirá de nós um produto particularmente especial e raro: a sinceridade. Ela deixou de ser usada pelos “artistas” terrenos quando estes perceberam que as pessoas não reagiam bem a ela. Talvez por isso, o último passo seja o mais difícil. Mas vamos lá, você consegue.

Visualize na sua pintura um espaço privilegiado, de onde a visão para o trono de Cristo seja perfeita. Agora insira sua figura lá, sob os olhos de Jesus. Após tê-lo feito, contemple-se. Traduza-se. Decodifique-se. Que mensagem é transmitida pela sua expressão facial? Como seus olhos fitam o Cristo? Há um sorriso em seu rosto? Ou rolam lágrimas de tristeza em sua face? Sua reação é de compulsivo desejo de abraçá-lo ou a vergonha dos pecados acariciados fazem você desejar a morte? Que palavras você profere? A letra do esperado hino da vitória ou o clamor desesperado: pedras caiam sobre mim! As respostas a estas perguntas já estavam estampadas em seu coração antes mesmo de você pintar o quadro. Um quadro que, na verdade, sempre existiu.

Há uma conseqüência irremediável nessa experiência: a consciência de que esse quadro pintado por você é, na verdade, a pura realidade escondida atrás das ilusões e sonhos fúteis rabiscados sobre a tela original.

A morte de Cristo nos concedeu a chance de “mudar o quadro”. O sangue do filho de Deus, vertido por nós, possibilitou que sejam feitas retificações da nossa expressão na pintura. Se permitirmos e formos fiéis, Cristo pode colocar um sorriso em nossos lábios, apagar as lágrimas que desfiguraram nosso rosto, corar a fria e obscura palidez de nossa fase. Ele quer que você fique bem no retrato.


Carnaval Televisionado


Mesmo da redação, eu recebia as baforadas ludibriantes invadindo meus sentidos. A música, cadenciada num ritmo tentador, parecia obrigar todas aquelas pessoas a balançarem seus corpos sem pudor, como zumbis hipnotizados. Espasmos acelerados e desprovidos de qualquer significado conduziam a multidão. Todos exibindo um exagerado sorriso no rosto. Estava acompanhando o Carnaval 2008 pela televisão.

Foi nessa hora que percebi a noção do perigo. Ouvi as batidas da sola do meu sapato contra o chão postiço da “câmara filosofal” (é como me refiro à redação às vezes). O som oco reverberava no espaço silencioso, competindo apenas com o alarido da festa, proveniente da TV. Parei de supetão e, apontando o controle remoto para o aparelho áudio-visual, reduzi o volume. Não queria que, mais uma vez, meus sentidos fossem roubados e me visse sendo arrebatado para a festa.

Comecei a imaginar, com uma expressão de gratidão no rosto, como seria se eu tivesse sido escalado para cobrir a festa no circuito. Certamente não ouviria o som das minhas pisadas no chão. O que, então, me faria recobrar os sentidos? Um soco desferido por alguém com o dobro do meu tamanho? Muito provável.

O carnaval acabou e, após a quarta-feira de cinzas, ficou guardada uma certeza bastante colorida (Não, não era a certeza de que a próxima festa que eu iria cobrir seria a Parada Gay). Era a certeza de que NADA QUE ESTE MUNDO POSSA OFERECER ME DARÁ O PRAZER QUE TENHO EM CRISTO JESUS.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Serra da Caraconha | Cap_3


O fato de Ana ir à minha frente, mostrando-me onde as pedras eram firmes e onde eu não deveria pisar, me deixaram meio sem graça e sentindo que algum comentário sobre a cena estava na iminência de mostrar-se. Veio de David, caçoando da forma como eu “optei por proteger” minha namorada. No entanto, ele se encontrava tão distante da esposa (Mara) que mal podia vê-la.

Começamos a subir a todo gás o percurso ainda não tão íngreme. Marcas do sangue da senhora machucada sinalizavam as pedras nos locais onde era preciso apoiar-se com o joelho. Crianças (teimosas) esgueiravam-se por entre a relva seca, assumindo a ponta dianteira do grupo. Vislumbrar o comando inexperiente a guiar-nos confirmava a desordem.

Uma pausa para reordenar o inconcebível antes que a montanha começasse a castigar-nos com o aladeiramento progressivo de suas rochas proeminentes. Consumíamos água rápido, mas não com a mesma velocidade com que ela ficava quente. Bebíamos assim mesmo. O estômago embrulhando. A saliva espumando. Os lábios começando a rachar.

Chegamos abaixo da toca da onça, ponto ainda distante da metade do monstro de pedra. Mas foi ali, naquele esconderijo de pedras geladas, que recebemos nosso primeiro presente. Todos fizeram silêncio. Introspectivos. Sugando ao máximo a experiência de estar entre os céus e a terra. Pagaríamos (e caro) todo o prazer sentido nos nossos próximos passos...

Por amor


Um deserto causticante atravessei pra ter você,

O oceano revoltado enfrentei só pra te ver;

Escalei o arco-íris, a penumbra do céu rasguei;

Quebrei firmes rochedos até que enfim te encontrei...

Serra da Caraconha | Cap_2


Ao levantar-se, com dificuldade incomum, notou que suas mãos estavam sujas de sangue. As extremidades pontiagudas dos galhos secos arranharam-lhe o corpo, mas, por milagre, não lhe perfuraram a pele. O sangue que escorria sobre a poeira quente inpregnada em sua canela suada provinha do seu joelho direito, que, agora, mostrava uma rótula disforme por traz da epiderme esfolada. “É um aviso. Eu não vou subir”, ponderou a senhora enquanto a dor atinava.

Sob uma árvore de folhas escassas, os ânimos foram arrematados por um curto discurso realista pronunciado pelo “diretor da expedição”. Mais sóbrios, seguimos em direção ao monte de rochas proeminentes. Muitas crianças e mulheres ficaram após o discurso. Prosseguiram os mais audazes, inclusive a senhora de 68 anos.

Finalmente chegamos ao pé da serra e começamos a caminhada. Eu, com duas garrafas pequenas de água enfiadas na cintura, disse com minha voz possante de baixo agregada ao sentimento machista. “Ana, você vai até aonde der. Eu vou até o topo”, afirmei olhando para cima. “Eu vou até o topo”, respondeu Ana (minha namorada) com um tom de desafio.

“Será que vou conseguir? Aquelas pedras não parecem nada firmes...”, balbuciada sozinho já nos primeiros passos. O fato de Ana ir à minha frente, mostrando-me onde as pedras eram firmes e onde eu não deveria pisar, me deixaram meio sem graça e sentindo que algum comentário sobre a cena estava na iminência de mostrar-se...

Fluxo de Consciência


Nos tornamos dependentes de um caminho solitário virgem vertigem mórbida incandescente doente demente que surge de um ponto de luz e se abre num espaço infinito de risos e choros constantes quase permanentes ludibriantes que castigam a carne humana merecedora de castigo e dilacera nervos proeminentes provenientes de traição e desgraça alheia que atinge em cheio coração inocente que acredita em um amor doloroso febril e angustiante porém existente e por isso confortante ver sofrer injustamente o pobre ébrio na esquina que deixou de ser menina dos olhos de quem tem poder para ser e ter e ver o pobre ébrio sofrer menos que um sóbrio que vê e entende e faz idéia do quanto é doloroso viver para ver o pobre ébrio sofrer até que a luz venha tragá-lo para o fim do túnel escuro de rubor ofegante sufocante de pulmões inúteis sobre a terra quente de um deserto causticante sem umidade para afogar pulmões ensopados de água que procuram o ar de um deserto causticante e não acham paradoxo diagnóstico precoce do inconformismo hedonista perseguido buscado anelado morto e sem ar e sem água e sem terra quente do deserto causticante orgulho exacerbado do nada que possui e nem possui permitir denegrir rebaixar contingente erário honorário carga horária horário inexistente de dormir e suportar o insuportável outro lugar anelado como prêmio imerecido fraco e vulnerável pecado racional banal mortal como um pobre ébrio sofredor enganador de escarnecedor inocente caluniador e corrupta lacuna mental apagada por tortura cabal obscuro mistério eterno sangue em movimento no externo visível humano e sombrio espaço acessível a qualquer ébrio sofredor...

Amor gélido


Conquistador caro, mas apenas um conquistador. Faz a paixão ser verdadeira. Nunca trabalha com a ilusão. Sua especialidade é saber provocar o amor, embora nunca o tenha sentido realmente. Envolve-se, funde-se, contamina-se. Razão e emoção numa mistura homogênea. Escura. Fria.

Passa a desejar que seja eterno aquilo que certamente terá um fim. Machuca-se ao machucar. E cada vez que faz um ser amado sofrer, castiga-se machucando-o mais. A dor é tão intensa que nem a certeza de que os momentos bons fizeram tudo valer a pena o conforta.

É difícil orgulhar-se disso. Ele sangra enquanto escreve. Mas o sangue que escapa pelas suas veias, a vida que dele esvai e leva consigo sonhos próprios e alheios, é pouco comparado ao que vaza, enérgica e ininterruptamente, dos cortes que fez no coração de todas que, sorrateiramente, se aproximou.

Não mais dorme, não mais ri. Apenas consola-se: “Cortei, machuquei, fiz sangrar porque posso. Provoquei risos. Por que não posso fazer chorar? Por muito tempo a fiz feliz, tenho o direito de fazê-la sofrer. Nada mais justo”...

Serra da Caraconha | Cap_1



O ar puro só não era mais agradável porque o calor escaldante o transformava em um mormaço maciço que, misturado à poeira que alçava vôo ao sabor do vento, tornava-se ainda mais denso. O silêncio, impiedoso e resistente, parecia duelar com tímpanos viciados em sons urbanos que teimavam em procurá-los em meio à caatinga deserta.

Os desacostumados com a ausência de ruídos tentavam quebrá-lo a golpes de efeitos audíveis, provenientes de aparelhos eletrônicos capazes de ler arquivos MP3. Os burburinhos e as músicas incompatíveis com o ambiente pareciam entrar em rota de colisão com a natureza e com o que ela tentava nos presentear: o som, a cor, o cheiro e o sabor da paz...

Diante da imponente Serra da Caraconha, todo orgulho e ostentação deram lugar ao respeito e, não se deve negar, ao medo. Nem bem chegamos ao pé da montanha e já pude ver as primeiras gotas de sangue a marcar o solo seco. Uma senhora de 68 anos, empolgada com a aventura que lhe aguardava, destinou sua atenção e cuidado na hora de atravessar uma cerca e arame farpado, mas não teve sorte no passo que deu em seguida.

Peles humanas já haviam sido “levemente dilaceradas” nas farpas do arame. Deram sinal de existência os primeiros gritos de dor. Costas arranhadas foram às primeiras conseqüências da euforia desmedida por parte de alguns.

Logo após atravessar a cerca, a frágil senhora de desequilibrou e caiu sobre galhos secos (mas vivos) característicos da caatinga. Ao levantar-se, com dificuldade incomum, notou que...