quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Maluco do Punhal | Cap. 18


(Leia o primeiro capítulo da série: Maluco do Punhal Cap. 1)  

O telefone tocou, quebrando, com um estardalhaço exagerado, o silêncio na mansão do coronel Abigail. O velho emergiu do estado de introspecção no qual estava mergulhado. Atendeu. Era o delegado Frederico. A voz segura e ameaçadora trazia más notícias. Sem ponderações, desatou a falar sem deixar transparecer qualquer vestígio de sensibilidade:

 – Seu filho, o que chamam de Buzina, foi atingido com um tiro no peito. Segundo os peritos, o projétil deve ter atingido o coração. Ele morreu na hora. O corpo está no bar de Zé de Piló. Já era para o senhor ter sido comunicado, mas o oficial encarregado de fazê-lo hesitou. Novato, não quis ser o portador da notícia ruim. Sabe que o senhor inspira neles certo temor...

O poderoso Abigail já não ostentava a mesma imponência desde a visão, mais cedo, da lâmina brilhando ao sol. Sabia que aquela aparição macabra traria o mal consigo e recebeu aquela informação com uma estranha tranquilidade. Interrompeu laconicamente a fala sem pausa do delegado Frederico:


 – Certo... estou... indo. 

(Continua no décimo nono post da série: Maluco do Punhal | Cap. 19)

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Rumo (In)certo



Nasci por um descuido e acabei como o mais amado da prole, causador de ciúme entre os planejados. Cedo, tornei-me a personificação das voltas que o mundo dá. Responsabilidade demais para alguém sem habilidades notáveis à primeira vista. Mas não há opções para os que vivem. Todos os que colocam os pés neste mundo protagonizam uma jornada. Até quem opta pela estagnação está adotando um caminho. Esgueirei-me entre as esferas sociais, em busca de um ponto de equilíbrio entre abastados e famintos, já que os extremos sempre me transmitiram desconforto. Essa estranha patologia nunca aparece nos exames de sangue, mas habita minhas entranhas e faz cócegas no meu córtex pré-frontal. Vou ficar por aqui, aliás, vou instalar-me ali mais adiante, cercado por aquela grama mais verde, não verde vibrante como nos pastos que adornam o horizonte, mas certamente mais verde que a relva que emudece sob meus pés. 

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Maluco do Punhal | Cap. 17


(Leia o primeiro capítulo da série: Maluco do Punhal Cap. 1)  

Onde está o punhal? Onde está o punhal? Repetia mentalmente ignorando as promessas de vingança pronunciadas pelo seu companheiro de quarto. O forasteiro vestia apenas um avental com amarras frouxas nas costas. Estava descalço e sem as roupas de baixo, mas apenas o objeto afiado e brilhante lhe fazia falta naquele instante.

Revistou com os olhos cada canto do cômodo, deixando evidente a invasão súbita do desespero. O olhar parou numa pequena escrivaninha de duas gavetas. Levantou-se num salto, mas o percurso até o móvel foi interrompido por algo que agarrou seu pulso com firmeza. Uma algema o mantinha ligado ao leito de metal. 

(Continua no décimo oitavo post da série: Maluco do Punhal | Cap. 18)